segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Biscoitos de argila

       

- Vamos brincar de casinha João?
        Pergunta uma mãe haitiana tentando minimizar o sofrimento de seu filho faminto e  desnutrido. Senta aqui que mamãe vai preparar seu café da manhã. Então, caminha a passos trêmulos a jovem esquelética aparentando uns 53 anos e pega uma bacia velha. Coloca um pouco de água suja, lança uma gordura estranha parecendo uma margarina e acrescenta argila.
            Mistura todos os ingredientes, e as lágrimas que rolam em sua face, caem na bacia dando gosto salgado à massa. O gosto da angustia, do desespero, da falta de esperança, do esquecimento, da fome. Que sabor tem a fome?
           Logo depois, ela pega um pedaço da massa faz um biscoito redondo e põe para secar ao sol.
          - Pronto meu amor, o café está pronto.
          Então a brincadeira acaba. Mãe e filho se deliciam com aquela obra da natureza. Obra que nem o mais renomado mestre da culinária imaginaria. Obra esta, que é fruto de uma sociedade perversa que enquanto alguns se deliciam com caviar e saboreiam champagnes milionários e outros reclamam do seu diário feijão com arroz, outros seres iguais a nós estão fadados a saborear o ácido e insosso sabor da indiferença, do egoísmo e da crueldade de um sistema que para regar alguém com ouro precisa sugar a alma de outrem, até a mais faminta delas.
          Alguém aceita um biscoito de argila?

 
Jacques Manz



1 comentários:

Diane disse...

d++ esse....arrepiei...

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